quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Um dia tudo...no outro nada

Hoje você come de tudo, amanhã, praticamente, nada. Essa é a base da dieta que virou febre nos Estados Unidos. A Alternate Day Fasting já tem animado gordinhas e gordinhos no Brasil também. Você está nesse grupo? Calma, lá! Conheça os pontos positivos e negativos dessa história antes de testá-la



Poucas propostas são capazes de fazer tantos olhinhos brilharem ao mesmo tempo como a Alternate Day Fasting - ou simplesmente ADF -, que nasceu nos Estados Unidos e chega agora ao nosso país. Em vez de passar longas e tortuosas semanas ou meses maneirando nas calorias e no tamanho das porções, a nova dieta permite alternar restrição total com vale-tudo mesmo, na base do dia sim (day on), dia não (day off). No day off você só pode beber água, chás, sucos light, sopas ralinhas e comer uma barrinha de cereais com 0% de açúcar. No dia seguinte, day on, é permitido se perder no paraíso das massas, carnes e sobremesas hipercalóricas sem a menor culpa. Os defensores alegam que essa atitude emagrece porque é fácil de ser seguida e engana o metabolismo, ativando o gene SIRT1 - que inibe o gene PPAR-gama, responsável pelo armazenamento de gordura. Com o PPAR-gama em off-mode (modo desligado), o organismo tende a não armazenar gordura e o jejum ajudaria a desintoxicar e manter a longevidade. E todas essas virtudes têm supostamente o aval do National Institutes of Health (NIH) dos EUA, que financia estudos sobre restrição calórica. Mas antes de você se animar totalmente para testar a novidade, Corpo a Corpo foi atrás da opinião de algumas nutricionistas paulistanas que avaliaram a ADF:
Anna Christina Castilho, nutricionista e consultora em personal diet do Instituto de Metabolismo e Nutrição
Camila Prospero, nutricionista do Instituto do Coração
Elizabete Elvira de Paola, diretora operacional da Vital Nutri Assessoria e Consultoria em Nutrição e Qualidade de Vida
Glauce Lamoglie de Carvalho, nutricionista do Instituto do Coração
Fernanda Pisciolaro, nutricionista do Ambulatório de Bulimia e Transtornos Alimentares (Ambulim) do HC-FMUSP e do Departamento de Nutrição da Associação Brasileira para Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica (Abeso)
Patrícia Soares, diretora geral da Vital Nutri Assessoria e Consultoria em Nutrição e Qualidade de Vida
Tânia Rodrigues, nutricionista da RG Nutri

A ideia é realmente fácil de ser seguida? 
Nos dias livres, sim. Já nos dias off a coisa complica. Anna Castilho lembra que restrições calóricas tão severas como essas costumam ser impactantes demais para quem está habituada a consumir 3 mil calorias diárias, por exemplo, o que pode tornar a dieta desanimadora em pouco tempo. Fora o desconforto da fome, nos dias off ocorre um déficit de glicose, fonte de energia indispensável para o cérebro. Essa hipoglicemia gera dor de cabeça, irritabilidade e fadiga. "Nenhuma dieta assim é suportável por mais de uma ou duas semanas", afirma Elizabete de Paola. "Por isso, a tendência é fazer vários dias on e raros dias off", acredita Fernanda Pisciolaro.
A alternância entre dia on e dia off pode desencadear alguma sensação desagradável? 
Em ambos você poderá experimentar sintomas físicos e emocionais desagradáveis. "Nosso organismo funciona no que chamamos de homeostase - equilíbrio - e tudo que agride esse estado, como a restrição calórica ou a superalimentação, desencadeia mal-estar", explica Patrícia Soares. "Fora os sintomas imediatos de hipoglicemia durante os dias off, o consumo alimentar excessivo nos outros dias causará desconfortos gastrointestinais, como refluxo, nauseas, flatulência (gases) e dores no abdome", observa Tânia Rodrigues.
Mas há pessoas que garantem ter emagrecido com esta dieta... 
É que nos dias off, na falta de carboidrato suficiente, o organismo vai converter as proteínas do corpo em glicose e só depois utilizará a gordura - a última fonte a ser queimada. "Nesse processo perde-se peso, claro, mas é prioritariamente de massa muscular e de líquido, não de gordura", avisa Anna Castilho. "Para se ter ideia, uma restrição maior do que 45% das calorias diárias que o corpo necessita, significa que 25% do peso perdido são de massa magra," diz.
É possível emagrecer de fato seguindo esta linha? Ela engana mesmo o metabolismo? 
"Desconheço qualquer pesquisa sobre isso", afirma categórica Fernanda Pisciolaro. "Existem, por outro lado, inúmeros estudos que comprovam o contrário: que a restrição total provoca mudanças metabólicas que favorecem a estocagem de gordura corporal". Isso acontece porque o organismo tende a criar um sistema de defesa entendendo que corre o risco de ficar sem combustível para o funcionamento de órgãos e células - e procurará poupar na forma de gordura para usar quando necessário, levando a pessoa a engordar. "É inevitável: nos dias off, as substâncias envolvidas no metabolismo, como a insulina e os receptores das células de estoque no tecido adiposo, ficarão mais ativos para captar glicose e armazenar sob a forma de gordura", concorda Elizabete De Paola. Já acelerar o metabolismo é possível através do aumento da massa muscular, por exemplo. Quem tem mais Existe algum ponto positivo nesta ideia, como afirmam seus defensores?
Positiva é a liberdade da pessoa comer o que gosta, ter monotonia e menor restrição, porque a privação não se mantém durante dias, mas dia sim e outro não. "A pessoa não se cansa tanto", diz Camila Próspero. Em tese, é uma dieta que dá para levar o resto da vida, mas não da forma como se apresenta. "Um ponto positivo seria reduzir a angústia por falta de doces, visto que se pode consumi-los em dias alternados. A restrição total deixa a reeducação alimentar cada vez mais difícil ", afirma Glauce de Carvalho.
O National Institutes of Health realmente deu o aval para esta dieta? 
'O NIH é uma clínica que aceita voluntários para pesquisas de controle de peso e saúde, mas não tem indicadores e ferramentas que devam necessariamente ser copiados por todos", diz Tania Rodrigues. Ela acredita que não se pode afirmar que houve garantia, mas apenas a publicação de uma experiência com um número pequeno de voluntários. "O problema é que muitas instituições idôneas aparecem promovendo dietas absurdas, sem que as tenham realmente avaliado - no Brasil há vários exemplos disso, com dietas ditas da USP, do Hospital do Coração, do Hospital do Câncer etc.", esclarece Fernanda Pisciolaro. "Penso que a proposta tenha sido divulgada ou compreendida de modo equivocado, como na brincadeira do telefone sem fio", aponta Anna Castilho. "Ela pode até emagrecer e ser funcional de um modo bacana, mas não dessa forma, permitindo que se coma qualquer 'tranqueira' no dia on e com essa restrição de nutrientes no dia off. É preciso muita cautela e o acompanhamento de um profissional de nutrição - o ideal é que a dieta seja individualizada, variando conforme os hábitos e o estilo de vida da pessoa."
A proposta é capaz de inibir o gene responsável pelo armazenamento de gordura e diminuir a chance de doenças como o câncer?
As descobertas são baseadas em estudos recentes realizados em animais e ainda precisam ser testadas em humanos, explica Anna Castilho. "O real efeito da ADF sobre o emagrecimento, assim como sobre fatores de risco para doenças cardiovasculares e câncer, ainda continua incerto". O que se sabe hoje é que a quantidade de células adiposas de cada pessoa é determinada pela genética e é a quantidade de calorias ingeridas diariamente que fará com que essas células aumentem ou diminuam de tamanho. "A mescla de on e off pode levar ao armazenamento de gordura, não só pela possibilidade de maior ingestão calórica nos dias on, como pelas reações metabólicas estimulada pelos dias off", explica Tânia Rodrigues.
Quais os riscos da dieta ADF para o organismo se for seguida por um mês? E por seis meses?
"Provavelmente haverá um déficit da ingestão de vitaminas e minerais, pois, mesmo com um plano alimentar adequado, é raro o consumo de 100% das necessidades diárias dessas substâncias", avisa Camila Prospero. Em curto prazo, a falta de glicose dos dias de restrição total levará o organismo a fabricá-la a partir das proteínas, desviando-as de funções extremamente importantes, como a defesa imunológica e o equilíbrio hormonal. "Além disso, restrições nutricionais prolongadas são cientificamente desaconselhadas e podem ser perigosas para a saúde, resultando em grande perda de água, eletrólitos e minerais", observa Tania Rodrigues, "Não se pode prever os resultados em períodos específicos, já que cada organismo se comporta de um modo diverso, mas acredita-se que, a longo prazo, haja um aumento da concentração de LDL (colesterol ruim) devido à restrição de energia e ao consequente consumo de alimentos energéticos sem qualidade nutricional", adverte Tania Rodrigues. A manutenção da dieta por muito tempo pode alterar o funcionamento do organismo como um todo - desde a regulação neuroendócrina da fome e da saciedade ao metabolismo dos nutrientes. "Isso fará com que armazenemos mais gordura ou deixemos de manter sob controle a glicose do sangue, desenvolvendo diabetes tipo 2, obesidade permanente, dislipidemias, aterosclerose, bulimia, anorexia, doenças por deficiência de vitaminas e minerais (como anemia), distúrbios nervosos e dermatológicos e menopausa precoce, entre outros", conta Elizabete De Paola.
Qual seria a forma adequada de fazer esta dieta mantendo alguns de seus princípios?
A melhor maneira é priorizar os alimentos nutricionalmente saudáveis nos dias on - mas ainda assim permanece o risco de carências nutricionais, fraqueza, redução de massa magra e compulsões alimentares. "Por isso o ideal mesmo é seguir uma alimentação balanceada", recomenda Fernanda Pisciolaro. "Com isso você certamente chegará ao peso ideal, não sendo necessário alternar dias de bocalivre e dias restritivos." Para deixar essa dieta mais saudável, Anna Castilho, dá duas dicas de cardápio: "O dia on deve priorizar pratos balanceados. No dia off sugiro incluir carboidrato de baixo índice glicêmico (cereais integrais e vegetais) para não correr risco de ter hipoglicemia e emagrecer sem perder massa magra.

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